Se alguma coisa esta crise tem de ensinar ao mundo, é a importância da função poupança nas economias. Os anos recentes mostraram taxas de juro muito baixas, que aliadas à ganância dos bancos e ao relaxamento dos critérios de concessão de crédito levaram a um embriagamento colectivo da sociedade seduzida pelas facilidades aparentes dos empréstimos.
O sistema financeiro está a estabilizar e a economia mundial dá os primeiros sinais de retoma. A taxa de poupança está a recuperar. Mesmo depois da crise mais violenta desde os anos 30 não passa pela cabeça de nenhum responsável político mudar de sistema de desenvolvimento. O sistema capitalista conduziu o mundo a um crescimento económico sem precedentes no último século, conduzido pelos avanços tecnológicos e pelo engenho do espírito humano que na busca de lucros para os seu negócios - o seu bem próprio - proporcionaram avanços significativos no sistema económico, na organização do trabalho e no aumento da eficiência do sistema produtivo - o bem colectivo. Hoje produz-se muito mais com muito menos. Esta crise, tal como muitas outras já ultrapassadas, servirá para refinar o sistema, torná-lo mais regulado, mais eficiente, de forma a que o sistema económico ganhe bases de sustentabilidade mais fortes. A especulação financeira deverá ser mais regulada, a supervisão mais atenta e a poupança deverá ser muito mais incentivada.
De facto, o aforrador / investidor deverá voltar a ganhar protagonismo no sistema financeiro. Agora, mais do que nunca, será necessário que as pessoas se interroguem onde deverão investir as suas poupanças, tendo em conta, também, a desilusão que foi o investimento feito através dos maiores captadores e canalizadores de poupanças: os bancos. O investidor deverá entender o investimento que está a fazer, quer sejam depósitos a prazo, obrigações, aplicações financeiras complexas (produtos estruturados), ou acções.
Da análise dos últimos 200 anos verifica-se que os activos que proporcionaram os melhores retornos foram as acções. Sobrevivendo a todo o tipo de crises - epidemias, guerras mundiais, choques petrolíferos, convulsões políticas e sociais, recessões económicas gravíssimas - as acções superaram, por uma larga margem, todos os outros activos de investimento, como as obrigações, o ouro ou o dinheiro simples.
Ter uma acção de uma empresa significa ser dono de uma pequena parte dessa empresa e, por conseguinte, ser dono duma parte dos activos e dos lucros que essa empresa irá gerar no futuro. Os negócios das empresas, normalmente, protegem o investidor da desvalorização dos activos provocada pela inflação, uma vez que as receitas e lucros gerados acompanham a subida do nível médio dos preços. No entanto, o investimento em acções tem riscos: o risco, temporário ou permanente, da perda de capital; o risco de a empresa decidir não distribuir dividendos; ou o risco do negócio da empresa. Por isto mesmo, o investimento em acções deve ser realizado de uma forma extremamente cuidadosa, focado na criação de valor a prazo e diversificado por vários títulos, negócios ou sectores de actividade.
A selecção das empresas onde investir deve obedecer a critérios consistentes e rigorosos, que permitam a escolha de negócios com vantagens competitivas que nos possibilitem prever, com alguma grau de segurança que, num prazo do 5-10 anos, esses negócios continuarão por cá a gerar lucros substanciais e a criar valor para os accionistas. Desta forma, estamos a proteger o capital investido e potenciar a sua valorização sustentável a prazo.
Numa altura de grande incerteza em relação ao futuro das economias mundiais, devemos interrogar-nos como será o mundo daqui a 10 anos. Seremos uma sociedade assim tão diferente da que fomos nas últimas décadas? As empresas não continuarão a gerar lucros? As pessoas não continuarão a consumir? Estas questões podem parecer estranhas, mas ao vermos os níveis a que estão a cotar em bolsa muitas excelentes empresas, chegamos à conclusão que a maior parte dos investidores não acredita na valorização dos negócios a prazo e prefere não investir. Estas preocupações são excessivas e provocadas por dois sentimentos básicos da natureza humana que presenciamos todos os dias nos mercados financeiros: o medo e a ganância. O economia há-de recuperar, o sistema financeiro voltará a funcionar normalmente e as boas empresas continuarão a gerar lucros para os seus accionistas.
Estes são, de facto, tempos extraordinários para o investimento em acções. Uma criteriosa carteira de investimentos deverá proporcionar retornos bastante acima da média para o investidor comum.
É claro que seria muito mais fácil investir quando todas estas nuvens de incerteza se dissipassem. No entanto, paga-se um preço muito elevado por um consenso optimista do mercado, isto é, quando o optimismo é generalizado, as acções estão muito mais caras. Os grandes negócios são feitos quando poucos investidores vêem com clareza o futuro.
As empresas de referência, a nível mundial, que normalmente transaccionam a prémio, encontram-se ainda a transaccionar a níveis de desconto significativos, que garantem ao investidor uma margem de segurança bastante confortável, considerando um período de investimento de 2 a 5 anos.
Hugo Roque