segunda-feira, maio 17, 2010

O Investidor Empreendedor

O pai da filosofia de Investimento em Valor, Benjamin Graham, escreveu aquelas que foram consideradas por Warren Buffett, o melhor investidor de todos os tempos e discípulo de Graham, as palavras mais importantes sobre investimento alguma vez escritas: “O investimento é mais inteligente quando é mais orientado para o negócio”. O investimento numa acção é mais eficiente, é melhor analisado, melhor entendido e possui uma melhor probabilidade de ser bem sucedido se for encarado como uma compra de um pedaço de um negócio. Quando se investe em determinada empresa, comprando algumas das suas acções, fica-se com direito a uma pequena parte dos seus resultados, do seu balanço, dos seus fluxos de caixa e dos seus dividendos, porque efectivamente se detém uma pequena parte dessa empresa. Por essa razão faz todo o sentido analisar meticulosamente todas as vertentes do negócio, as suas rentabilidades, margens, qualidade dos produtos, qualidade da gestão, vantagens competitivas, perspectivas futuras de evolução do negócio, a concorrência, a solvabilidade do seu balanço, as suas dívidas, o património que possui, etc, de forma a determinar se existe valor naquele negócio/investimento que ainda não foi reconhecido pelo mercado, e que, desta forma, pode dar lugar a um investimento proveitoso.

Os empresários facilmente se identificam com esta postura, na medida em que todos os dias e no ambiente da gestão do seu negócio têm de tomar dezenas de decisões orientadas para a maximização da eficiência e valor da sua empresa. Decisões relacionadas com a gestão interna operacional do negócio, com o marketing, recursos humanos, tesouraria, mas também com a gestão da aplicação de excessos de liquidez, com a estruturação de financiamentos, com a gestão de riscos cambiais, de taxas de juro e de matérias-primas, entre outros.

Para todas estas questões, a melhor solução será concerteza encontrada se o empresário evidenciar capacidade analítica, disciplina para não tomar decisões em áreas onde não possuiu competências, paciência e persistência para catapultar o negócio para o futuro na altura certa, e coragem para investir, aceitar os riscos mas verificar a existência de valor no investimento. Todas estas são características do Investimento em Valor, porque, na verdade, estamos a falar de uma postura comum de racionalidade, de trabalho duro e de temperamento perante os investimentos com o objectivo de minimizar riscos e maximizar resultados. Warren Buffett corroborou esta ideia de cumplicidade entre o empreendedorismo e o investimento afirmando que: “Sou um melhor empresário porque sou um investidor e sou um melhor investidor porque sou empresário”.

No entanto, estas características fundamentais dos grandes empresários/investidores são características profundamente inatas. Não se podem ensinar nas faculdades, em cursos de gestão ou de marketing. Podemos aprender num curso como analisar um negócio e como avaliá-lo, e esses são ensinamentos extremamente valiosos se feitos correctamente, mas não podemos aprender a ter paciência, a não correr atrás da moda do momento, a manter as decisões simples e compreensíveis, a ter coragem de fazer um investimento significativo no ponto de máximo pessimismo e um desinvestimento relevante numa onda de total euforia. Este enquadramento mental único tem de nascer com a pessoa.

A todos os investidores e empresários é dito que para se poder obter elevadas taxas de rentabilidade, são obrigados a ter que tomar riscos mais altos. As estratégias de Investimento em Valor têm demonstrado ao longo dos tempos que é possível conter riscos e mesmo assim obter retornos bastante razoáveis. Para tal é importante o desenvolvimento de uma filosofia sustentada de investimento e de uma boa estratégia de pesquisa e de análise de todas as variáveis inerentes ao desenvolvimento do negócio.

Certamente que nunca terá passado pela cabeça do empresário Belmiro de Azevedo de desinvestir ou mudar totalmente o enfoque de trabalho das suas empresas mesmo tendo em conta todos os graves desenvolvimentos económicos dos últimos dois anos e meio e as suas consequências, incluindo desvalorizações das suas empresas em bolsa de mais de 50%. No entanto, o grupo SONAE mantém-se activo no mercado procurando reforçar a suas posições de liderança e pesquisando novos mercados e produtos por onde crescer, com a convicção de que, a prazo, serão atingidos bons resultados e o mercado reconhecerá o valor das suas acções.

Tal como o investidor em valor, o empresário mantém o seu rumo, aprendendo sempre com os seus erros, mas mantendo-se firme perante as suas convicções, focando-se nas suas áreas de competência, e tendo a persistência para continuar, mesmo perante as mais graves dificuldades, a trabalhar para a criação de valor. Esta é a filosofia do Investidor Empreendedor.

Disclaimer: Este comentário consiste unicamente numa opinião do autor e nunca uma recomendação de compra ou venda. As compras e as vendas são da responsabilidade do investidor, bem como os lucros ou as perdas daí resultantes. Em caso de dúvida, o investidor deverá procurar contactar um intermediário financeiro, a Euronext ou a CMVM.

Hugo Roque

segunda-feira, maio 03, 2010

Oportunidades no Mercado Português

A crise financeira na Grécia perturbou os mercados europeus fazendo recuar os principais índices accionistas. Portugal, também tem estado em destaque com a crescente especulação de que poderá ser o país que se segue em termos de risco de incumprimento. A última agência de rating a afirmá-lo foi a S&P que concordou que as finanças públicas portuguesas actuais são distintas das gregas (défice de 9.4% vs 13.6% dos gregos; dívida pública de 76.8% contra 115.1%) mas deixa dúvidas relativamente ao dinamismo económico nacional, prevendo que o crescimento económico anémico da década passada (cerca de 1% ao ano) se mantenha nos anos vindouros. Tal deverá tornar muito mais difícil o objectivo da consolidação orçamental na medida em que a redução do défice encontrará entraves na realização de receita fiscal como consequência da paralisação económica e na diminuição da despesa devido a uma provável manutenção de uma alta taxa de desemprego. O rating de crédito atribuído a Portugal foi de A- com outlook negativo, ou seja, com perspectivas de vir a baixar no futuro.

Para combater estes problemas foi apresentado o Plano de Estabilidade e Crescimento (PEC) que tem como objectivos a diminuição do défice para 3% em 2013 e a inversão da tendência de subida da dívida pública. Para ajudar ao cumprimento destes objectivos são lançadas medidas de aumento de impostos e de privatizações de activos do estado. Ou seja, em 2013 e cumprindo-se as estimativas do plano estaremos ainda a incorrer em défices (que contribuem para o avolumar da dívida do estado), a nossa dívida será apenas um pouco superior à actual, apesar de se continuar a delapidar património do estado, a economia continuará a progredir muito lentamente e sem motores claros de crescimento económico e produtivo, e o desemprego continuará a atingir valores elevados. Resumindo, não parece que esteja a ser preparada uma verdadeira estratégia de inversão de tendência do rumo da economia nacional, mas antes uma tentativa suster um problema para depois continuarmos a obter mais do mesmo.

O mercado português tem sido severamente penalizado. O principal índice nacional, o PSI20, recuou cerca de 17% desde os máximos relativos de Outubro de 2009. Apesar do contexto conjuntural e estrutural em que o país se encontra e mesmo tendo em conta estimativas de crescimento bastante pobres, esta queda acentuada da praça financeira portuguesa assenta fundamentalmente na especulação de que Portugal poderá entrar em incumprimento do serviço da sua dívida. Tal será muito difícil de acontecer na medida em que, quando comparado com a Grécia, Portugal, apesar de tudo, apresenta maior credibilidade das suas estatísticas, indicadores económicos mais sustentáveis, reservas externas 3 vezes superiores às da Grécia, reformas relevantes na área da segurança social, etc.

Mesmo havendo, no limite, algum problema de curto prazo com o financiamento da economia portuguesa, não será concerteza do interesse da União Monetária Europeia (UEM) que algum dos seus membros entre em incumprimento, tendo em conta as possíveis consequências para moeda única e para a sustentabilidade de outros países membros em situações semelhantes. Deste modo, e como está já a ser feito com a Grécia que tem acordado um pacote de financiamento de 110 mil milhões de euros com a UEM, no limite, Portugal seria ajudado no refinanciamento da sua dívida, apesar de lhe vir a custar a imposição de medidas mais severas de contenção.

O Investidor em Valor procura sempre oportunidades de investimento em mercados onde o grau de incerteza seja grande mas o risco esteja, de alguma forma, limitado. O mercado português pode, neste momento, providenciar algumas dessas oportunidades. De notar, no entanto, que cada investimento deve ser individualmente ponderado, analisado e decidido, na medida em que, a prazo, o mercado acabará por transparecer o valor intrínseco do negócio, em função do seu desempenho.

Duas Oportunidades de Investimento

Cerca de 2 meses atrás deixamos uma ideia de investimento no mercado nacional: a Energias de Portugal (EDP). Com um total de 81% dos resultados a derivar de actividades reguladas, o negócio da EDP apresenta características de grande estabilidade e previsibilidade. Por outro lado, mais de 50% dos resultados já têm origem fora de Portugal providenciando diversificação e flexibilidade operacional à empresa. A vertente das energias renováveis e o potencial do mercado brasileiro deverão ser importantes catalisadores de crescimento. Com uma relação preço-resultados líquidos (PER) de 12 e um dividendo de cerca de 5,7%, é uma oportunidade com valor.

O Banco Espírito Santo (BES) é, neste momento, o maior banco português em termos de capitalização bolsista. O produto líquido bancário, por actividade, reparte-se da seguinte forma: banca comercial (78,3%); banco de investimento e de financiamento (11%); prestação de serviços financeiros especializados (5,6%); gestão de activos (4,6%); outros (0,5%). Possui uma rede de 757 agências implantadas essencialmente em Portugal. O BES tem demonstrado capacidade para ultrapassar a actual conjuntura com indicadores sólidos ao nível do seu balanço, uma estrutura accionista forte e uma estratégia internacional adequada, que deverá potenciar o crescimento do banco em mercados externos nos próximos anos. Essa vontade tem sido demonstrada com recentes investimento em mercados como Inglaterra, Dinamarca ou a Líbia. O banco paga um dividendo de cerca de 4% e está a cotar com um rácio do seu preço em relação ao valor contabilístico por acção de 0.68. Bastante atractivo.

Disclaimer: Este comentário consiste unicamente numa opinião do autor e nunca uma recomendação de compra ou venda. As compras e as vendas são da responsabilidade do investidor, bem como os lucros ou as perdas daí resultantes. O Autor pode ter, e provavelmente tem, posições nos títulos referidos. Em caso de dúvida, o investidor deverá procurar contactar um intermediário financeiro, a Euronext ou a CMVM.

Hugo Roque