Três dos maiores bancos norte-americanos vão devolver ao governo americano as ajudas recebidas em plena crise financeira de 2008 que contribuíram para estabilizar um sistema financeiro extremamente frágil e em risco de sucumbir perante a falta de confiança dos agentes económicos. A iniciativa foi do Banc of America, mas rapidamente se juntaram o Citigroup e Wells Fargo, com objectivo de se soltarem das rédeas do estado às quais estavam sujeitos. O sinal transmitido aos mercados foi mais um a confirmar a tendência de estabilização do sistema financeiro e a confirmação de que estão criadas condições, pelo menos operacionais, para o seu regular funcionamento autónomo. A nível regulatório, para o sector bancário, são de esperar novidades em 2010, estando neste momento a ser discutida no congresso e senado a possibilidade de aprovar uma lei que separe a banca de investimento da banca de retalho (seria o ressurgir da lei Glass-Steagall que havia sido abolida em 1999), bem a criação de um supervisor único para as instituições bancárias. A nível económico, a banca deverá ainda de ter de suportar uma recuperação que se prevê que seja lenta, embora começando a gerar alguns sinais óptimistas, por exemplo dos sectores do imobiliário ou retalho, mas que ainda não se reflectem em indicadores fundamentais como a taxa de desemprego.
Wells Fargo & Co
Pressionado pela decisão do Banc of America e Citigroup de devolverem as ajudas recebidas ao estado, o Wells Fargo foi “forçado” a tomar o mesmo caminho, apesar de, anteriormente, sempre afirmar que desejaria devolver o capital ao estado de uma forma que não prejudicasse o accionista. No entanto, tal não foi possível e o Wells Fargo teve de fazer um aumento de capital de cerca de 12,25 mil milhões de dólares por forma a dispor de fundos suficientes para poder pagar os 25 mil milhões de dólares que foram injectados no banco, por intermédio do TARP, o programa de estabilização do sistema financeiro elaborado pelo governo. No entanto, esta operação foi a mais bem conseguida de entre os três bancos, com o accionista a sofrer uma diluição de apenas cerca de 3% e com o banco a conseguir manter a robustez e solvabilidade do seu balanço.
O Wells Fargo opera no mercado americano com uma estratégia e posicionamento de mercado muito simples: construir relações duradouras com os seus clientes com ponderação meticulosa da qualidade dos seus créditos concedidos. Tal permite ao banco exibir todos os anos as melhores rentabilidades do mercado. A imagem de solidez do banco torna-o muito atractivo para o investidor aforrador permitindo ao Wells Fargo usufruir de uma base de depósitos com custos muito baixos (cerca de 26% dos seus depósitos não são sequer remunerados). O banco apresenta uma margem de juros líquida de 4.9% de 2003 a 2008 e uma taxa de retorno média do capital próprio de 19%. A estratégia passa por colocar à disposição dos clientes pacotes de produtos que permitam sustentar relações comerciais de longo prazo. Em média, no Wells Fargo, cada cliente usufrui de 5.9 produtos oferecidos pela sua rede bancária.
O Wells Fargo foi um dos bancos menos afectados pela recente crise financeira mundial que afectou fatalmente algumas das maiores instituições financeiras mundiais como a Bear Sterns ou a Lehman Brothers. A crise atacou principalmente os bancos que estavam pior posicionados em termos da qualidade dos seus créditos concedidos e que não sustentaram o rebentar de uma bolha do mercado imobiliário americano. O Wells Fargo provou novamente, nesta crise, a qualidade da sua gestão e dos activos que detém no seu balanço, reforçando a confiança que os seus clientes depositam na instituição. O banco aproveitou igualmente um tempo de verdadeiro tumulto financeiro para a realização de um negócio que vai marcar decisivamente o seu futuro: a compra do quase falido Wachovia. Por 15 mil mihões de dólares, o Wells Fargo absorveu mais de 600 mil milhões de activos, mais que dobrando os valores totais dos seus activos em balanço, e tornando no 4º maior banco norte-americano com 6600 agências no país. O Wells Fargo pretende transportar a sua filosofia, estratégia e critérios de concessão de crédito para os funcionários oriundos do Wachovia, com o objectivo de continuar a ser uma referência de solidez para os seus clientes. Programas de fusão de divisões e de redução de custos estão também previstos por forma a potenciar sinergias e contribuir para um aumento da eficiência do banco.
Para a banca em geral o grande problema continuam a ser os prejuízos resultantes do incumprimento de créditos concedidos. O Wells Fargo também não é excepção continuando a demonstrar perdas em 2.5% do total dos empréstimos concedidos. Valores historicamente elevados para o banco mas consideravelmente inferiores à média actual da indústria. A estimativa é a de que os prejuízos continuem até que a taxa de desemprego inicie a sua redução, algo que poderá começar no segundo semestre de 2010.
A Berkshire Hathaway, o conglomerado do 2º homem mais rico do mundo – Warren Buffett, é o maior accionista do banco com 6.71% (já detém participação no banco desde o início dos anos 90, altura da penúltima grande crise bancária americana) tendo aproveitado a recente crise para aumentar a sua posição.
Um excelente banco, com uma excelente gestão, focado na criação de valor para o accionista a prazo e com uma grande aquisição para absorver. Para o Wells Fargo, a crise pode ter sido a verdadeira oportunidade para provarem o seu valor ao mercado.
Disclaimer: Este comentário consiste unicamente numa opinião do autor e nunca uma recomendação de compra ou venda. As compras e as vendas são da responsabilidade do investidor, bem como os lucros ou as perdas daí resultantes. O Autor pode ter, e provavelmente tem, posições nos títulos referidos. Em caso de dúvida, o investidor deverá procurar contactar um intermediário financeiro, a Euronext ou a CMVM.
Hugo Roque
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